Como uma continuação da semana anterior quando conversamos sobre exercícios físicos e seus benefícios para quem pratica, um fato importante surge: é preciso também prestar atenção à galera torcedora.

Por causa de minha intensa participação como fiel torcedora e mãe de atleta pude observar ao longo desse tempo todo que as reações dos pais frente aos desafios de nossos pequenos são os mais diversos.

Alguns pais se descabelam, gritam, falam palavrões. Outros assistem aparentemente pacíficos enquanto outros caminham de um lado a outro, saem do ginásio para beber, comer ou fumar. E alguns passam mal. Muito mal. Taquicardia e pressão alta são os campeões de audiência.

No último jogo eu e mais três mães acompanhamos outra mãe ao ambulatório do clube. Sua pressão estava nas alturas.

No dia seguinte aos jogos/competições sinto-me exausta. O corpo está dolorido, os pensamentos caminham devagar pela minha mente, meus olhos não acompanham viradas bruscas da cabeça. Resumindo: fico um lixo.

Isso me faz pensar que até para ser torcedor devo estar em forma!

De fato, médicos especialistas nessa área explicam como as emoções surgem no cérebro e se manifestam no corpo enquanto assistimos nossos ídolos, filhos, amigos ou completos desconhecidos.

A simples expectativa da espera uma semana, um dia, uma hora antes do confronto esportivo já gera uma sensação de inquietação e medo. É a ansiedade. O corpo reage liberando doses homeopáticas de adrenalina e noradrenalina pelas adrenais, preparando o corpo para o estresse iminente: a competição.

Em geral esse fato aumenta os batimentos cardíacos, a atenção, pois as pupilas reagem à adrenalina e se dilatam, captando melhor as imagens ao redor, bem como as contrações intestinais podem ganhar velocidade e força. Daí que algumas pessoas podem apresentar constipação, gases ou diarreia no dia da competição.Tanto no atleta quanto no torcedor. Mas também pode gerar o famoso “branco” na hora da prova. A culpa é do cortisol alto na hora do desafio. Este último privilégio apenas do atleta.

Não alcançar o pódio, pisar na faixa branca antes de saltar, bater o pé na barra, errar a cesta, levar ponto do time adversário é uma grande frustração registrada pelo cérebro que comanda a liberação de cortisol na corrente sanguínea ao mesmo tempo em que gesticulamos nossa insatisfação. Ele faz nosso coração bater um pouco mais rápido e a respiração acelerar.
Como a adrenalina e a testosterona também podem estar presentes e em alta concentração nos torcedores mais afoitos, o sangue então é desviado para órgãos mais nobres e para os músculos, o que deixa a pele pálida e mais tarde pode gerar insônia, dor de cabeça e falta de apetite.

O serumaninho quase chegou em primeiro lugar, o juiz registrou uma falta injusta, alguém queimou a largada mas ninguém mais viu, só você, a mesa não marcou a pontuação certa. Raiva. Muita raiva.

As adrenais capricham na liberação de adrenalina e cortisol aumentando a contração da parede das artérias ao mesmo tempo em que aumenta o fluxo de sangue passando por elas, já que seu coração parece que vai saltar pela boca, resultado dos batimentos cardíacos que saltam de 80-90 para 150 batimentos por minuto.

Ofegante e com raiva agora, pois a testosterona vem junto e provoca a vontade de esmurrar o primeiro que passar perto. Mulheres também produzem testosterona, afinal temos adrenais.

OUTROS ARTIGOS DE ELAINE FRANCESCONI:

MEMÓRIA CELULAR E SEUS BENEFÍCIOS AO LONGO DA VIDA

A HUMANIDADE DENTRO DA HUMANIDADE

GLÂNDULAS: ESTRESSE, AUTOCONHECIMENTO E FELICIDADE

PROFESSORA DE FISIOLOGIA ESCREVE ROMANCES NA INTERNET

Estudos realizados com torcedores de futebol, apontam que hipertensos devem pegar leve com a dieta, evitando sal e gorduras em excesso, que podem piorar o seu quadro em dias de competição, pois há muitos casos de morte súbita em dias de jogo.

Isso é uma grande droga. Nada combina mais com jogo do que pipoca, refrigerante e cachorro quente.

Essa situação toda me faz lembrar um desenho da Disney mostrando o pateta, um ser pacífico e alegre se transformando ao entrar em seu carro, passando de “senhor andante” para “senhor volante”. Seu cabelo arrepia, os dentes crescem pontiagudos e os olhos ficam vermelho sangue.

É exatamente assim em dias de competição. As mães e pais anteriormente pacíficos transformam-se ao se sentarem nas arquibancadas. O corpo totalmente alerta e ansioso pela prova prestes a acontecer, reconhece o evento como uma situação estressante que pode ser demonstrada com violência, agressividade, muito xingamento ou apenas com arrepios e respiração rasa e rápida. Depende de que mente/corpo que estamos falando.

Já quando o garoto ganha no salto em altura, na corrida com obstáculos, pega um rebote sensacional ou dá um toco histórico é aquela alegria sem fim. Uma euforia tão grande que dá vontade de abraçar todos à volta, de ligar para a avó coruja para contar o feito maravilhoso e nem dar bola porque não conseguiu filmar ou tirar foto. Só dá vontade de gritar e sorrir de felicidade.

São a serotonina, a dopamina e as endorfinas inundando os neurônios, fazendo uma sopa de emoções em nosso cérebro. É como se o tempo parasse. Tudo fica mais nítido e mais colorido afinal elas deixam os órgãos sensoriais mais sensíveis aos estímulos e a nítida sensação de felicidade infinita. As lágrimas vêm aos olhos mesmo que estejamos sorrindo como bobos. A vida é bela como nunca foi. Eu amo meu vizinho e meu cunhado chato. Nada pode estragar essa euforia.

No dia seguinte vem o esgotamento como resultado de uma situação de grande concentração de hormônios e neurotransmissores no organismo, provocando emoções profundas e reações dramáticas, como se os atletas fossem os torcedores.

Essa é a verdadeira razão do cansaço absurdo do dia seguinte e do motivo de estarmos sempre lá. A emoção que nos segura em pé, que dá sentido e felicidade aos nossos dias.
Então eu penso: como sou sortuda por poder vivenciar isso e compartilhar essas emoções com outros sortudos fiéis torcedores de sua prole. (foto acima: Agência Brasil)

 

TORCEDORELAINE FRANCESCONI

Bacharel em Zootecnia (UNESP Botucatu). Licenciatura em Biologia (Claretiano Campinas). Mestrado (USP Piracicaba) e doutorado (UNICAMP Campinas) em Fisiologia Humana. Professora Universitária e escritora