Lixo Eletroeletrônico, realidade de TEMPOS DIGITAIS

Desde os tempos em que se vivia nas cavernas, o homem sempre produziu lixo. Esse lixo, hoje, dentro do politicamente correto, definido como resíduo, vem sofrendo alterações quanto a sua composição e quantidade, conforme evolui a espécie humana da caverna para a era digital. Passamos da produção de lixo orgânico, até início da Revolução Industrial, para resíduos sólidos que na sua maioria contêm sempre um tipo de composto químico nocivo ao meio ambiente. A cada ano produzimos mais resíduos no planeta. Essa constatação até pode ter conotação positiva, se considerada como indicador de desenvolvimento humano, visto ser compreensiva a equação de que quanto mais crescimento, mais consumo e por consequência, mais resíduos. O problema reside no que fazer com alguns tipos de resíduos que representam sério perigo de contaminação ambiental e sérios risco à saúde humana. Não bastassem os problemas com esse tipo de resíduo, altamente nocivo ao meio ambiente, ainda existe o problema das movimentações transfronteiriças de lixo, onde, ainda hoje, os chamados países desenvolvidos têm a petulância de descarregar o seu indesejado resíduo em países pouco ou nada desenvolvidos, conforme recentes casos ocorridos no Brasil. Para se combater esse tipo de problema, de âmbito internacional, basta que sejam aplicadas as regras estabelecidas na Convenção de Basiléia de 1989, ratificada pelo Brasil em 1992, através do Decreto Legislativo nº 34/92 e Carta de Adesão firmada em outubro do mesmo ano. No âmbito nacional, a questão pode ser tratada com a aplicação da legislação vigente, além de tornar efetiva a logística reversa daqueles produtos que após utilizados (lixo eletrônico), possam representar perigo para o meio ambiente. Porém, no contexto, a realidade do lixo em geral no país é mais complexa, merecendo destaque a produção de lixo eletroeletrônico, resultado do consumismo exacerbado em tempos digitais. Segundo relatório da Universidade das Nações Unidas, publicado em 2015, o Brasil é o país que mais produziu lixo eletrônico na América Latina e segundo dados estatísticos, as perspectivas continuam apontando ritmo de crescimento, nessa modalidade consumista.

Apesar da Lei Federal nº 12.305/10, que trata da Política Nacional de Resíduos Sólidos não trazer a definição legal do que seja lixo eletroeletrônico, no Estado de São Paulo, a Lei nº 13.576/09, o define como sendo todos os tipos de aparelhos eletrodomésticos e os equipamentos e componentes eletroeletrônicos de uso doméstico, industrial, comercial ou do setor de serviços que estejam em desuso e sujeitos à disposição final. A lei federal e a estadual diferem quanto a responsabilidade jurídica, atrelando-a aos resíduos sólidos e produtos eletrônicos. A primeira considera a responsabilidade compartilhada entre fabricantes, importadores, distribuidores e comerciantes, consumidores, titulares de serviços públicos de limpeza urbana e de manejo, portanto mais abrangente. Já a lei estadual fala somente da responsabilidade solidária entre empresas que produzam, comercializam ou importam produtos e componentes eletroeletrônicos. A logística reversa, solução apontada para o problema do lixo eletrônico, encontra-se definida na PNRS, como sendo um instrumento de desenvolvimento econômico e social caracterizado por um conjunto de ações, procedimentos e meios destinados a viabilizar a coleta e a restituição dos resíduos sólidos ao setor empresarial, para reaproveitamento, em seu ciclo ou em outros ciclos produtivos, ou outra destinação final ambientalmente adequada. Trata-se da possível reciclagem desses produtos ou de sua eventual destinação a locais adequados, que não os aterros sanitários, como ocorre atualmente. Quando não for possível reaproveita-los, bem como seus componentes, devem ter destinação adequada. A maioria dos equipamentos eletrônicos contém componentes químicos que não só prejudicam o meio ambiente como também representam grande risco para a saúde humana. Entre eles destacam-se como componentes perigosos o chumbo, o mercúrio, o cádmio e o berílio. À título de exemplo, conforme pesquisas, um só aparelho celular contém de 500 a 1000 componentes, dos quais alguns são classificados como perigosos para o meio ambiente e à saúde humana. Também é certo que alguns produtos contem considerável quantidade de produtos minerais valiosos, como ouro, prata, cobre, entre outros. No Congresso Nacional, tramitam alguns projetos de lei para tratar da questão do lixo eletrônico, mas parece o momento não é propicio ou é mesmo falta vontade política dos parlamentares em apreciar e votar a matéria, estando todos estagnados (PL 3551/2012; 4272/2012; 2426/205; 2940/2015; 3732/2015; 5007/2016; 6700/2016; 8040/2017; 7642/2017).

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É prudente reconhecer que houve avanços (pequenos) na aplicação de políticas relacionadas à coleta e destinação dos resíduos sólidos no país, principalmente após a edição da Política Nacional de Resíduos Sólidos, através da lei nº 12.305/10. Ainda existe, mas são poucos os exemplos de pneus abandonados, bem como das embalagens de agrotóxicos, plásticos, alumínios, entre outros tipos de resíduos. A atuação especializada do Ministério Público, através de ações civis públicas e termos de compromissos firmados exigindo o cumprimento das normas ambientais tem contribuído para o avanço na aplicação da lei. Ainda assim, persistem resistências em relação há alguns aspectos envolvendo resíduos sólidos e nenhuma ação mais direta em relação ao lixo eletroeletrônico. O fabricante e o distribuidor ainda se recusam a assumir responsabilidade legal sobre o produto que fabricam ou comercializam, pós uso, seja quanto a reciclagem ou quanto a logística reversa, como acontece no caso dos resíduos da Construção e Demolição, nos resíduos dos Serviços de Saúde, além dos equipamentos e produtos eletroeletrônicos que contenham componentes químicos prejudiciais ao meio ambiente e à saúde humana. Ainda se descartam televisores usados às margens de riachos e outros locais inapropriados, representando perigo para o homem e para a natureza.

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A Abrelpe – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais, desde 2003, vem elaborando pesquisas sobre a situação em geral dos resíduos sólidos no país, com base na Política Nacional de Resíduos Sólidos, porém na sua mais recente divulgação do Panorama dos Resíduos Sólidos no Brasil – 2016, não trouxe maiores informações sobre o atual quadro do lixo eletrônico no país. Segundo divulgado, até em relação aos resíduos sólidos vem ocorrendo certo negligenciamento por parte do poder público, que somado ao desrespeito dos responsáveis diretos e indiretos pela sua correta destinação, tem representado retrocesso na aplicação e aprimoramento necessário das regras estabelecidas pela PNRS. Invoca-se a crise econômica para se safar da responsabilidade. Quanto ao lixo eletroeletrônico, esse tem ficado mais a cargo da iniciativa privada, através de empresas especializadas na reciclagem desses produtos, para obtenção de materiais, minerais e químicos, de interesse do setor produtivo. Sabe-se que o Brasil é o país que mais produz lixo eletroeletrônico no mundo, com cerca de 200 toneladas/ano. Somente não se sabe qual a real destinação dessa montanha de lixo eletrônico. Se vai para aterros sanitários, há forte probabilidade de que seus componentes perigosos estejam contaminando o solo e lençol freático. Caso estejam sendo queimados, é certo que estão produzindo perigosas toxinas para a saúde humana.

Num mundo cada vez mais consumista, somado a obsolescência dos produtos eletroeletrônicos, mais a carência e o desrespeito à legislação, além da falta de consciência e sensibilização da população é bem provável que, infelizmente, ainda assistiremos por algum tempo, o triste cenário do televisor “instalado” em mananciais brasileiros. (foto acima: www.commons.wikimedia.org)


ferraz-400x267-2-400x267JOSÉ ROBERTO FERRAZ

Ex-comandante da Guarda Municipal de Jundiaí; delegado aposentado da Polícia Civil; especialista e professor de Direito Ambiental.